quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

Sobre entrevista de Lincoln Secco


Claro que é uma entrevista, a saber se foi editada, ou se Lincoln corrigiu algo depois de publicada. Isto posto, alguns breves comentários:

1- O PT é um típico partido social-democrata....

Isto não é verdade.
Pode ser social-democrata, mas típico não é.
Até porque o Brasil não é um país europeu, imperialista etc.
Quanto ao desencantamento ter chegado mais rápido no PT, não vamos confundir o desencantamento de parcelas da esquerda e de setores da base, com o  desencantamento das massas em geral.

2-O PT se considera o grande vitorioso nas ultimas eleições, mas ideologicamente ele foi derrotado. 

Do que ele está falando? De 2010?
Se for isto, poderíamos no máximo dizer que houve uma derrota parcial, no sentido de que ficamos na defensiva durante a campanha (diferente de 2006), com o PSDB e a direita nos pautando durante grande parte da campanha.
O jornal O  Estado de S. Paulo deu destaque para esta resposta de Secco, provavelmente porque a resposta permite entender que o PT sofreu uma derrota moral em 2010, logo a resposta de Secco engata com a tese do PT corrupto etc.

3- A postura de Secco frente ao chamado mensalão

Em 2005, Secco fazia parte de um núcleo do PT que ia as manifestações carregando uma bandeira petista virada de cabeça para baixo, o que em linguagem militar significa dizer algo como nossa fortaleza foi invadida.

Agora ele diz o seguinte: Pessoalmente acho que José Dirceu deveria ser absolvido porque nenhuma Justiça é justa quando é seletiva e condena sem provas. Este sentimento perpassa também a base petista. Já a direção do PT comete um erro grave: ou ela defende os condenados, o que ela dificilmente fará, ou os esquece. .

É divertido: o Dirceu ele defende, e pau na direção do PT.

Claro que a posição da direção do PT é contraditória. Mas há como ser diferente? Porque Secco pode ser contraditório e dizer que Dirceu merece ser absolvido, mas não admite que a direção do PT possa ser contraditória? 

Quando, convenhamos, seria muito mais fácil a Secco ser 100%, pois se trata de uma pessoa (e não de uma instância composta por diferentes posições) e de um intelectual (e não uma direção de um partido)..

4-Duvidoso

Como historiador, Lincoln diz que só pode fazer projeções duvidosas. 

Mas vejamos o que ele diz: Outro cenário seria a renovação geracional rápida das lideranças, o que já vem acontecendo graças ao próprio mensalão. Só que ela teria que vir acompanhada de um acerto de contas decidido com aqueles episódios de 2005, seja assumindo tudo o que foi feito em nome da legitimidade do legado do governo Lula, seja abandonando de vez seus velhos dirigentes e redefinindo-se como agremiação supostamente republicana e de centro.

Veja que curioso: ele admite duas possibilidades. Ou legitimamos o que ocorreu ou viramos republicanos e de centro. Não há terceira hipótese. Não existe a possibilidade de uma autocrítica petista pela esquerda.

Lincoln chega a dizer com todas as letras que o PT não precisa mudar a estratégia, pois ela deu certo até agora

O que obviamente não é verdadeiro: a estratégia esgotou-se. Como aliás o próprio Lincoln dá a entender diversas vezes na própria entrevista.


Para concluir: acho que a interpretação de Lincoln repousa em paradigmas esquerdistas (PT tipicamente social-democrata) e sua conclusão é conformista (as alternativas postas são apenas pela direita). E nenhum esforço intelectual é feito para tirar desdobramento do que é dito, como se fosse algo secundário, ao final da entrevista:as políticas sociais do PT só são "revolucionárias" porque a direita não as incorpora.

Pequeno detalhe: a burguesia.



 

'O PT se considera vitorioso, mas ideologicamente foi derrotado'

Para historiador, oposição conseguiu 'colar a marca da corrupção' na sigla, que pode perder força para o PSB ou virar um PMDB

12 de fevereiro de 2013 | 7h 00
 
 
 
Isadora Peron
Aos 33 anos, completados no último domingo, o PT, que já havia abandonado o discurso socialista, assiste, agora, à subtração do discurso da ética após o julgamento do mensalão, que abateu e condenou seus principais dirigentes políticos. A avaliação é do professor da USP Lincoln Secco, autor de A História do PT (Ateliê Editorial).
Para Secco, o PT não consegue mais transmitir ao eleitor uma mensagem de esperança como em 1989 e em 2002, quando elegeu Luiz Inácio Lula da Silva presidente da República.
"No voto, o PT ainda se manterá forte por alguns anos", afirma o professor, que faz, porém, um alerta: se quiser se manter no poder, o partido terá de se recuperar do desgaste ideológico.
Qual PT completou 33 anos? O que ficou do PT do Colégio Sion?O PT teve o mérito de combinar uma tradição clássica da esquerda com os novos valores de 1968. O restante da esquerda demorou para incorporar efetivamente a defesa das mulheres, negros e homossexuais, por exemplo. O PT aplicou as cotas nas suas direções internas antes de usá-las em seus governos. O que ele abandonou foi o radicalismo verbal dos seus anos primaveris e a aversão às alianças com os partidos fisiológicos.
Isso significa que o PT de antigamente jamais apoiaria a eleição de dois peemedebistas às presidências da Câmara e do Senado? Sem dúvida. Ele faria como o PSOL faz hoje: lançaria um anticandidato.
O PT ainda é um partido de esquerda?Esquerda e direita são conceitos relacionais. Só há dois blocos políticos relevantes no Brasil e, certamente, o PT está mais à esquerda do que o bloco liderado pelo PSDB.
Existe o risco de, como aconteceu na Europa com a saída do poder dos partidos social-democrata, uma direita ainda mais conservadora emergir no Brasil?O PT é um típico partido social-democrata, mas condensou em pouco tempo o processo de moderação que a Social Democracia viveu em um século. O desencantamento chegou mais rápido no PT. No entanto, a extrema direita no Brasil só terá chance de ameaçar o PT se as condições internacionais lhe permitirem atuar fora da legalidade. No voto, o PT ainda se manterá forte por alguns anos.
Acredita que Lula possa voltar a disputar a Presidência em 2014?Lula é um patrimônio do PT e de grande parte da sociedade brasileira. Ele poderia ganhar as eleições, mas só seria candidato se o governo Dilma vivesse uma crise. Como isso não está no horizonte politico, eu creio que ele será o maior cabo eleitoral de Dilma.
Qual o peso de Lula hoje dentro do PT? E o de Dilma?Obviamente o peso de Dilma cresceu por causa de sua condição como presidente. Mas ninguém duvida que a última palavra no PT será sempre de Lula. Depois da vitória de Fernando Haddad em São Paulo ele ganhou ainda mais confiança do partido.
O PT ainda pode empunhar um discurso ético após a condenação de figuras históricas no julgamento do mensalão?O PT se considera o grande vitorioso nas ultimas eleições, mas ideologicamente ele foi derrotado. Em 1989 aconteceu o contrário: o PT teve uma derrota eleitoral, mas uma vitória moral. Isso foi tão importante que mesmo com a queda do Muro de Berlin, a diminuição da base de sindicatos importantes da CUT nos anos seguintes e o esvaziamento militante das ruas, o PT continuou agregando as esperanças de mudancismo. Agora, não mais.
Por quê?Porque o PT não tem mais uma mensagem de esperança como tinha em 1989 e em menor medida em 2002. Ele não projeta o novo, apenas gasta um patrimônio já constituído. O fato de que depois de sete anos o partido ainda esteja na defensiva no caso do mensalão revela que ele tem sido ideologicamente derrotado. A oposição conseguiu colar no PT a marca da corrupção.
Mas a defesa da cúpula do PT contra o julgamento do Supremo Tribunal Federal e essa "marca da corrupção" foram tímidas até agora...Pessoalmente acho que José Dirceu deveria ser absolvido porque nenhuma Justiça é justa quando é seletiva e condena sem provas. Este sentimento perpassa também a base petista. Já a direção do PT comete um erro grave: ou ela defende os condenados, o que ela dificilmente fará, ou os esquece. O que não é possível é silenciar sobre o julgamento e, depois, permitir que José Genoino assuma o mandato. Expulsar Delúbio Soares e admiti-lo novamente. O Estatuto do PT prevê expulsão de condenados com sentença transitada em julgado. Foi uma medida tomada de afogadilho depois dos escândalos de 2005. Mas o PT não vai cumprir este artigo depois que o STF publicar o acórdão. Então por que assumiu esta impropriedade?
O senhor disse certa vez que escândalos como mensalão não iriam prejudicar a história do PT, mas sim o futuro do partido. Por quê?Por mais que o partido se mantenha forte eleitoralmente, no longo prazo ele é julgado como produtor de valores. O discurso socialista o PT já abandonou, o da ética lhe foi tirado. Seus novos eleitores passarão a ter novas exigências, além das demandas sociais que já foram atendidas.
E qual será o futuro do PT?Como historiador eu só posso fazer projeções duvidosas. Se a atual tendência de desgaste ideológico se confirmar, o PT continuará sendo uma agremiação com votos, mas pode perder a liderança, seja para o PSB ou mesmo para a oposição. Ele ficaria cada vez mais parecido com o PMDB. Outro cenário seria a renovação geracional rápida das lideranças, o que já vem acontecendo graças ao próprio mensalão. Só que ela teria que vir acompanhada de um acerto de contas decidido com aqueles episódios de 2005, seja assumindo tudo o que foi feito em nome da legitimidade do legado do governo Lula, seja abandonando de vez seus velhos dirigentes e redefinindo-se como agremiação supostamente republicana e de centro.
O PT comemora este ano também dez anos no poder. Qual a estratégia para não perder a Presidência em 2014? Conquistar a tão falada classe média?O PT não precisa mudar a estratégia, pois ela deu certo até agora. O que acontecia em São Paulo? Ele tinha o voto da periferia, mas no resto do Brasil os mais pobres se dividiam e apoiavam majoritariamente a direita. O modelo paulistano se espraiou pelo País. Hoje, o PT tem forte apoio entre os mais pobres. Não que ele não queira a classe média, mas pode viver sem ela por enquanto. O que ele não pode perder é a nova classe trabalhadora que ele ajudou a integrar no mercado.
O sr. acredita que ascensão de muitos brasileiros à classe média pode prejudicar o PT, especialmente se crise financeira se agravar? Não. O eleitorado do PT foi conquistado por políticas sociais que vão se manter. E o PT sempre tem um plano B: Lula.
Tirar o governo de São Paulo das mãos do PSDB em 2014 é considerado prioridade de Lula. O que isso vai significar para o partido?Será a mais difícil batalha do PT depois da conquista da presidência. Se por um lado há amplo desgaste do PSDB pelo tempo que já tem no governo, o que favorece o PT, por outro não há uma tradição de acomodação do ideário petista com o pensamento dominante no interior paulista, que tem prioridades diferentes das politicas sociais petistas. O PT poderia buscar incorporar valores que agradam a um imenso eleitorado de um mundo corporativo que só existe em São Paulo em grandes dimensões. Mas a cúpula do PT paulista já deu provas de que dificilmente faz isso: ela prefere culpar os eleitores, chamando-os de naturalmente reacionários. E é por isso que Lula ignorou o PT local e impôs Fernando Haddad, um candidato palatável para a classe média.
Por que a oposição está tendo tanta dificuldade em lançar um nome forte à Presidência para 2014?A oposição precisa de duas coisas: um novo nome e um discurso. Se ela insistir no discurso que seus intelectuais tem produzido, continuará agredindo os eleitores que ela precisa conquistar. Ir além da ética seria o caminho, mas ela inverteu os papéis do passado. Quando o PT fazia este discurso ético, elegia bons deputados e perdia eleições para o executivo. Só que o PT tinha também uma história, uma base militante. Enfim, tinha outros discursos possíveis. A oposição ainda não tem. Só que os recursos humanos e materiais com os quais ela pode contar não são nada desprezíveis e não é impossível pavimentar um caminho supostamente moderno, calcado em valores de mercado, mas sem desprezar o que socialmente já foi conquistado pelo PT. A oposição não sabe, mas as políticas sociais do PT só são "revolucionárias" porque a direita não as incorpora. Não há nada de radical em i mesmo no programa Bolsa Família. Ele não ataca o grande capital.


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